Thursday, September 21, 2006

EPISÓDIO 19

O SUBORNO
Wenderson, o porteiro do colégio, negro, namorador, fanqueiro, louco por qualquer menina, quando saía à noite pra “catar”, como ele mesmo dizia, vestia-se de maneira quase irreconhecível, como qualquer jovem da sua idade. Boné, roupa dark, botas pretas, correntes, etc.
E naquela noite, enquanto se preparava pra ir à Quadra, recebeu um telefonema que o deixou mais animado ainda. A garota falava com voz macia, sensual, procurando se insinuar. Mas em determinado momento, quando a menina mudou o rumo da conversa, Wenderson ficou intrigado:
- Peraí, gatinha! Qual é a sua?
- Ué bro, tô te falando?
- Ainda não saquei porque devo tirar uma foto da lourinha pra você. Qual interesse?
- Véio, vai amarelar? Pô! Deixo o celular naquele lugar que te disse. Junto, três notas de R$ 100,00. O que você tem a fazer é...
- Mas....
- Posso continuar? – a garota pareceu irritada.
- Vai fundo!
- Tu pega o celular e as notas. Quando vir Andie, discretamente fotografa ela. E depois devolve o celular no mesmo lugar onde pegou. Quando devolver, tem mais duas notas de 100 pila* te esperando.
- Uau!!! – o rapaz deu um salto. –Tá valendo, gata!
- Tem que pegar o celular daqui a meia hora. Vai à Quadra?
- Já tô atrasado!
- Demore mais meia hora.Vai faturar uma grana legal! Vou colocar o celular no lugar combinado, ok?
- Ok, gatinha! Gostei da sua voz, sacou? Depois a gente poderia...
A resposta que obteve foi o corte brusco da ligação, que o deixou meio abobalhado.
Quem estava ao lado da garota, depois de desligar o telefone, estendeu duas notas de R$ 100,00 pra ela, que feliz com a recompensa, confessou:
- Putz!!! Nunca pensei que um trote me rendesse tanta grana!
Quem estava ao lado da garota acenou irritado, pedindo-a para se retirar.

Wenderson colocou o boné, ajeitou a calça cuidadosamente para que a beirada da cueca branca de grife aparecesse e olhou o relógio. Pensou nos 300 pila que iria faturar na maior moleza e se preparou pra ir ao local indicado.

2ª parte
Meia hora depois, o porteiro pegou o aparelho, ao mesmo tempo em que uma idéia atravessou a sua mente. Iria descobrir o número do celular e assim faturar mais grana em cima de quem ligou.
Ao se dirigir para o baile fanque depois disso, ele nem imaginava que todos os seus passos estavam sendo matematicamente observados.

Três dias depois, Wenderson recebeu outro telefonema da mesma pessoa. Ele já havia fotografado a lourinha e iria devolver o celular. Embora fosse um aparelho de última geração, o rapaz não conseguiu descobrir o número. Acabou desistindo. Afinal, tinha ganhado R$ 300,00 na moleza.

Conforme combinado, deixou o aparelho num canteiro de gerânios e ficou escondido atrás de uma árvore pra ver quem viria buscá-lo. Passou-se muito tempo. O rapaz começou a ficar cansado e resolveu se sentar num banco meio escondido pela vegetação, quando passou por ele uma garota negra, linda, de trancinhas afro e bastante atirada, fumando.
Wenderson não resistiu quando a garota se sentou num banco de frente e ergueu a perna pra amarrar o tênis. Ele viu “tudo“. E “aquilo” deixou ele doidão. Levantou-se e foi até lá. Ela sorriu, disse um oi. O rapaz sentou-se tão perto que sentia o calor do seu braço.
- E aí, gata?
A menina, jogando o cigarro fora, completou.
- Estamos aí!
- A fim de um cineminha?
- Só... mas antes, me espera aqui? Vou ao banheiro do parque!
- Ok!
Ela saiu. Wenderson se lembrou de que estava na expectativa de descobrir quem vinha pegar o celular. Rapidamente correu ao local. O aparelho já não estava mais lá. Decepcionado, ele constatou:
- Droga! Vacilei! Ainda bem que vou faturar a neguinha!

Assim que a garota contornou uma alameda florida, saiu de trás de uma árvore um motoqueiro, jaqueta de nylon, luvas de lã, botas sujas de lama e calça de moletom muito surrada. Irreconhecível, como qualquer motoqueiro de capacete. Não para a garota, que o esperava. Ele apenas esticou a mão sem ao menos abrir a boca e passou pra ela três notas de R$ 100,00. Com os olhos arregalados, a menina sorriu.
- Desde o primeiro telefonema pro tal do Wenderson, não consigo entender...
O motoqueiro, irritado, dando chutes numa árvore, tirou as luvas. E como se fosse esganar a negrinha, avançou na sua direção.
A menina saiu correndo e gritando. Ele também se assustou com a reação dela. Subiu apressadamente na moto e se mandou dali.

Assim que se viu seguro, o motoqueiro estacionou, retirou do bolso o celular com a foto de Andie e olhou-a cheio de ternura. Depois, num gesto propício de uma criança, encostou os lábios no aparelho como se estivesse beijando a lourinha.
Felício Galvão fechou lentamente o celular e guardou-o no bolso da jaqueta. Seus olhos brilhavam de felicidade.

Nota: pila é real em gauchês. Não se usa no plural.

Medo, ciúmes, intrigas e mistérios. Os ingredientes do EPISÓDIO 20. Não perca! E não perca também umas perguntinhas pra testar o seu humor em Na Ponta do Lápis.

24 Comments:

At 4:50 PM, Blogger Rubo Medina said...

RESUMO DOS EPISÓDIOS 17 E 18
PENSAMENTO ALADO
1 – Pela primeira vez Dulcinéia não assiste as novelas.
2 – Ela vê uma entrevista na TV e cai na risada.
3 - Dulcinéia conhece um motorista novato na linha e fica pensando nele.
4 – Ela sonha novamente com o cavaleiro de cabelos ao vento e com o motorista novato da linha, que embaralhados em seus sonhos, transformam-se no prof. Galvão.
5 – Aparece pela primeira vez na trama a cozinheira do Ministro – Penha.

 
At 10:33 AM, Anonymous Anonymous said...

Armou bem o suspense, não?

 
At 3:24 PM, Anonymous Anonymous said...

Se fosse no Rio o cara ia "pegar umas cachorras" e não catar umas meninas, rs*...... Aff, que tristeza esse vocabulário dos meninos de hoje, né?

beijos, querido e bom fim de semana

MM
Mônica Montone

 
At 3:25 PM, Anonymous Anonymous said...

passei aki perto e resolvi vir te visitar:)desejo um iluminado final de semana bjo lusitano

 
At 5:45 PM, Anonymous Anonymous said...

E então o Renomado Professor Gavião
agora ataca de motoqueiro encapacetado que distribui notas de 100 pila a torto e a direito pra conseguir uma foto da amada Andie só pra sí. Coitada da Dulcinéia! Nem mesmo o Wenderson deu bola pra ela! E o motorista do ônibus, sei lá se vai reaparecer pra tirar o Gavião da cabecinha da pobre...
Vamos aguardar a continuação...

Abração.

 
At 6:19 PM, Blogger Liliane de Paula said...

O motoqueiro era o professor Galvão?
Liliane de Paula

 
At 6:18 PM, Blogger benechaves said...

Oi, Rubo: acompanhando aqui mais um capítulo de seu episódio. E as tramas vão se sucedendo e nos deixando curiosos com a continuação.Boa sorte!

Um abraço...

 
At 6:52 PM, Anonymous Anonymous said...

Nossa Rubo... o episodio de hj foi enigmatico e completo! Até o instante da moto eu não fazia ideia de quem estava por detrás dessa armação toda... e tudo por uma foto?!
Um abraço!!

 
At 9:24 PM, Blogger Marco said...

Grande Rubo!
Olha, a trama toda foi bem engendrada, com a dose certa de suspense. Fico aqui pensando se seria necessário tanto aparato para tirar uma foto com celular. Hoje em dia tem umas teleobjetivas bem legais. Sairia mais barato. Mas aí não teria essa magia, esse mistério todo, não é? Os diálogos estão em gírias indefinidas pra mim. "Pila" é gauchês, mas tem outros locais que também falam isso. "Catar" mulher também não me define com clareza. Essa indefinição faz parte do mistério da trama?
A história continua e nós atrás dela. Um abração, grande Rubo!

 
At 8:13 AM, Anonymous Anonymous said...

RUBO esclarece as gírias para o Marco do blog ANTIGAS TERNURAS:
1 - catar = é pegar, paquerar, namorar.
2 - véio = velho.
3 - bro = brother, do inglês.
4 - amarelar = desistir, vacilar, não querer fazer.
5 - fanqueiro = aportuguesei do funk.
6 - o "tudo" e "aquilo"... rs tá claro... rs.
7 - faturar = conquista, ganhar, ficar com.
8 - neguinha = negrinha (coloquial)

 
At 9:52 AM, Blogger Claudinha ੴ said...

Oi Rubo!
Hmmm, catar é uma palavra muito usada aqui e eu vivo brigando com meus jovens por isto, é a linguagem deles. Outra que usam aqui é: quem você tá "pegando"? Feio né? Mas está na boca da moçada...
Quanto sacrifício por uma foto... Mas quando se está apaixonado... a gente faz coisas que nem Deus acredita...
Beijo!

 
At 12:22 PM, Anonymous Anonymous said...

Como vai, amigo Rubo? Este com certeza foi o melhor episódio de Dulcinéia que li. Bem construído, amarrado, numa interessante e empolgante sequência de fatos até a revelação do motoqueiro misterioso. Realmente essa história fica cada vez melhor! Grande abraço!

 
At 3:10 PM, Anonymous Anonymous said...

Meu amigo, aos poucos estou voltando e vou lendo teu conto. Estava com saudade. Küssens.

 
At 6:09 PM, Blogger Passageira said...

Menino, desta vez vc se superou no suspense! Nunca que eu imaginaria o phd tão apaixonado!rs...
Mas uma coisa chama a atenção: a linguagem dos meninos e meninas! Pobre até não poder mais, né? Triste isso!
Beijo grande

 
At 11:16 AM, Blogger Marco said...

Rubo,
Eu sei o significado que cada uma das gírias que voc~e citou. Eu tinha escrito que estava indefinido, por não saber ao certo ONDE a história se desenrola. As gírias não são indicativas disso. Você disse que "pila" é nativa do Rio Grande do Sul. A história se passa lá? Mas "pila" é usado em outros estados também. Foi esse o motivo do meu comentário. Mas acho que valeu o "glossário" para quem não conhece o significado das gírias que você usou. Abração!

 
At 5:06 PM, Anonymous Anonymous said...

Olá Rubo. Lí os episódios de 13 a 19 e, fiquei pensando:Sua cabeça deve pegar fogo á noite quando vai dormir, um intricado de acontecimentos e uma trama, muito bem costurada com tantos personagens, permitindo facilidade no entendimento.
Parabens e até a póxima.

 
At 6:11 PM, Anonymous Anonymous said...

Meu Deus, Rubo! Isso é que é paixão!
O Felício merece conquistar a linda loirinha.
Você sabe como eu espero que esse romance tenha um final feliz!

beijos

 
At 6:53 AM, Anonymous Anonymous said...

O que as pessoas não fazem por paixão, por amor? Um renomado professor como o Galvão armando mil e uma armações só pra conseguir uma foto de sua adorada Andie.
Ja o novo personagem mostrando o tipo malandro tentando armar pra conseguir mais dinheiro de quem arrumou uma "grana fácil" pra ele.
Muito bom este episódio.Aguardo os proximos.
Abraços.

 
At 3:57 PM, Blogger http://graceolsson.com/blog said...

Triste sina da Dulcinéia.....quando vc vai decidir dar uam vida melhora pra ela?risos....beijocas

 
At 4:41 PM, Anonymous Anonymous said...

RUBO fica na dúvida:
Esse comentário acima, da CIGANA, afinal... rs, de quem ela está falando? Acho que o tiro "nao chegou a sair pela culatra"... rs

 
At 6:10 PM, Anonymous Anonymous said...

oie amigo... desculpa ta fugindo do assunto do sue blog, que por sinal é muito interessante, mas vim agradecer a força que vc me enviou através do Armando. Ainda estou sofrendo muito com tudo que aconteceu, mas tenho fé que Deus vai me confortar.
Obrigada pela força!!!
BJO, Erika

 
At 1:26 PM, Anonymous Anonymous said...

Rubo Medina meu estimado Escritor!
***
Sou sincera:
falo neste sítio
porque
adoro flores amarelas...
*
Tenho estado aqui,
mas vou silenciosamente...

Neste Momento,
dou parabéns
pela sequência de suas Palavras!
E...
fico na expectativa
de
"saber o futuro..."

Até breve
Abraço
ConchitaMachado

 
At 6:43 AM, Anonymous Anonymous said...

Sou fã de textos assim...Mergulhado no "tom" que está pretendendo passar. Linguagem adequada para os personagens. Excelente clima de suspense. Deixar para o final, sem mais nem menos, o professor aparecer "ao vivo"!!!! Gostei muito desse episódio. Por causa do vocabulário, por causa das gírias, por causa do universo dessa geração de jovens, que vc capricha na descrição: roupas, gostos, linguajar...Amei, mesmo!
Beijão!
Tô atrasada. Vou para o próximo capítulo...
Dora

 
At 5:39 AM, Blogger Tyr Quentalë said...

Olha só... quem diria que o professor Galvão faria uma coisa como esta? A intriga estava bem interessante, o desfecho que se seguiu foi intrigante. Não pelo fato de ser o professor, mas pelo fato da irritação dele que chegou a assustar a garota. Coitado do Porteiro. Ficou sem a garota no final da história.

 

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