EPISÓDIO 47 - final
Felício Galvão se levanta cambaleando, apoiando-se nos móveis, chega até a janela do quarto. Afasta as cortinas. Seus olhos se perdem na paisagem de concreto. Depois se volta e procura o celular. Encontra-o caído ao lado do criado. Começa acionar o teclado. A figura da lourinha, aquela que Wenderson fez quando ela alçou o véu sobre a cabeça, fugindo do grupo de chineses na portaria do colégio, aparece. O dedo polegar do professor pressiona uma tecla. Passados alguns instante uma voz se soa na sala.
- Alô!
A surpresa invade as fisionomias. A voz continua repetindo alô. Felício Galvão arregala os olhos. Dulcinéia recua. Sua mãe não entende o que está acontecendo. A voz, vendo que ninguém responde, silencia.
Há incredulidade por todo o quarto. Dulcinéia rompe o silencio, pedindo.
- Dê aqui o celular, professor!
Ele obedece. A copeira aciona novamente o número e mais uma vez se ouve no quarto.
- Alô!
Dulcinéia recua, apavorada. Depois tentando se controlar, fala, atropelando as palavras.
- Quem está falando?
- Andie! Quem e?
- A copeira do colégio Magnata!
- Dulcinéia...
- É Andie mesmo? Menina, você não está morta?
- Como morta, se estou falando com você!
- O acidente...
- Foi um engano, Dulcinéia. Foi sorte! Estava no aeroporto esperando um outro vôo, quando uma amiga chegou e me convidou para ir a Bertioga. Estou aqui...
- Inconseqüente!
- Vai começar a me xingar agora? Não entendo sua implicância...
- Fique sabendo que por sua causa, alguém quase morreu!
- Quem?
- O professor Galvão. Estamos no apartamento dele... O professor está doente há quatro dias por sua causa!
- Desculpe, eu não sabia...
- Vê se pode reparar o seu mal feito. Fale com ele!
- Dulcinéia, nessa altura...
- Nessa altura, todo mundo pensa que você morreu num acidente aéreo. Até sua amiga, a creTina, quer dizer, Tina.
- Meu Deus...
- Fale com o professor, Andie!
Pela primeira vez, Dulcinéia não sente raiva da lourinha. Entrega o celular ao professor, que o segura com mão trêmula. Mãe e filha deixam o apartamento silenciosamente, no exato momento em Felício Galvão começa a falar, inexplicavelmente agora revestido de uma jovialidade que preenche todo o ambiente.