EPISÓDIO 27 - 1ª parte
O rapaz, com voz naturalmente afetada, se apressou:
- Posso ajudar?
- Eu vinha andando, tropecei num buraco da calçada e minha sandália arrebentou a correia.
Gesticulando, agora sem encará-la, o rapaz disse impaciente.
- Aqui é um salão de beleza, meu bem!
A mulher, humildemente, esclareceu:
- Falei bobagem. O que quero é mudar a cor dos meus cabelos. Pra louro! E cortar um pouco as pontas!
Aí o rapaz, ajeitando os colares que adornavam o pescoço até à cintura, encarou-a. Em seguida, voltou-se para a colega que ainda lixava as unhas.
- Jô!
Jô olhou-o com cumplicidade. Depois disse à mulher:
- Senta aqui!
A mulher, arrastando a sandália arrebentada, sentou-se.
- Louro? Seu cabelo foi tingido recentemente. Não podemos descolorir agora!
- Que pena! Eu queria tanto fazer uma surpresa para o meu marido!
Disse fitando o rapaz através do espelho, o qual continuava folheando a revista sem lhe dar atenção. A mulher observava os seus cabelos mal tingidos e empastados de gel, quando a voz da cabeleireira desviou a sua atenção.
- Vamos tentar outra cor? Quem sabe caju, avermelhado... Não prometo milagres!
Ouvindo a sugestão, o rapaz levantou-se, colocou as mãos na cintura, girou sobre os calcanhares e censurou:
- Jô, você não disse a ela o preço!
A mulher, com voz humilde, retrucou.
- Preço não tem problema! Saí do emprego. Recebi meu FGTS. Acho que dá pra pagar!
A secretária estava na recepção lendo uma revista de esportes quando soou a campainha, anunciando a entrada de alguém. Apareceu uma mulher ruiva, trajando um vestido floral de alcinhas, brincos de argolas, anéis caros e pulseiras. Foi logo dizendo:
- Quero uma consulta com o oftalmologista agora!
- Está agendada, senhora?
- Estou! Veja!
A mulher abriu a bolsa e retirou um maço de dólares que manteve discretamente escondido sob a mão, de maneira que somente as duas pudessem ver.
Meio indecisa, a moça disse:
- Vou ver o que posso fazer. Pode esperar o paciente sair?
Com voz excessivamente amável, a mulher tranqüilizou-a:
- Claro, querida! O tempo que você quiser!
NA ÓPTICA
O balconista estava atendendo um cliente quando uma mulher ruiva, elegantemente vestida com um jeans meia-canela, bordado de pedraria na cintura, blusa de linha verde-cana, a qual delineava sensualmente os seios, brincos de argolas, anéis caros e pulseiras, entrou na ótica. Ele sorriu e pediu para que ela aguardasse um instante. A elegante senhora sentou-se, cruzou as pernas e mirou-se no espelho, olhando satisfeita para a cor dos cabelos tingidos no Salão da Jô.
Finalizado o atendimento, o balconista se prontificou:
- Pois não madame!
A ruiva levantou-se. Puxou a blusa para não deixar à vista a cintura. Rebolando, deu três passos e ficou frente a frente com o rapaz. Com um simpático sorriso, entregou a ele a receita oftalmológica, o qual, brincando, comentou:
- Agora é moda! Todas querem olhos verdes, azuis. Ainda bem que lentes de contatos podem fazer isso!
A ruiva sentiu vontade de estraçalhar o rapaz, mas limitou-se a sorrir, querendo confirmação:
- Você acha que combina com a cor dos meus cabelos? Quero parecer uma outra mulher!
- Certamente! Esses olhos castanho-mel com o tom do verde da lente.. nossa, vai ficar incrível!
A mulher sorriu, continuou conversando com o rapaz, experimentou as lentes, olhou-se no espelho. Aprovou o que viu. O balconista tinha razão. Os cabelos avermelhados, mais curtos, em contraste com os olhos verdes deram à Júlia a beleza digna de se passar por uma outra pessoa.
E era exatamente o que ela queria, depois do acidente no Galeria, em que um ataque fulminante acabou com a carreira de detetive do alemão.